Alain Gagnol, diretor da animação Um Gato em Paris

por Renato Silveira, com a colaboração de Heitor Valadão

Filmes de animação tradicional são cada vez mais raros. Tão raros, que até mesmo a Disney, estúdio que fez sua fama a partir do papel e hoje trabalha quase que exclusivamente com os computadores da Pixar, precisou homenagear seu passado com A Princesa e o Sapo. Hoje, o cinema de animação tradicional encontra mais espaço no mercado asiático e europeu, e é nesse cenário que Um Gato em Paris se insere.

O longa-metragem, dirigido pela dupla Alain Gagnol e Jean-Loup Felicioli, do prestigiado estúdio francês Folimage, não só desafia o mercado com sua técnica, como também faz uma aposta narrativa ao trazer para as crianças uma história policial.

Conversamos com Gagnol sobre essa proposta e as dificuldades impostas pela indústria. Confira a entrevista, a seguir.

Um Gato em Paris é distribuído no Brasil pela Bonfilm, organizadora do Festival Varilux de Cinema Francês. O filme está em cartaz em Belém, Belo Horizonte, Brasília, Campinas, Campos, Curitiba, Florianópolis, Fortaleza, Goiânia, João Pessoa, Macaé, Maceió, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, Santos, São Luís, São Paulo e Vitória.

Cinema em Cena: Animações tradicionais têm sido cada vez mais raras, muito devido a uma regra de mercado, pois as animações por computador se tornaram moda, e a maioria das pessoas quer sempre o que é novo. Como enfrentar essa pesada concorrência?

Alain Gagnol: O filme foi feito em um estúdio onde a animação tradicional é como uma tradição mesmo. Eu tenho trabalhado com a Folimage por muitos anos e nós nunca usamos computadores para animação. Eu não acho que o público goste tanto assim de novas tecnologias. O mais importante é a história e como a contamos. Se você tem uma boa história, você pode usar computadores, papéis ou o que você quiser, não importa. O poder da indústria da animação americana é que é o verdadeiro problema. Nós não podemos lidar com o orçamento que eles têm para propaganda. Eu realmente amo os filmes americanos, mas a competição não é justa. A maior parte do público nem sabe que o nosso filme existe.

Fale um pouco da origem da história de Um Gato em Paris. Como o projeto nasceu?

Como um escritor de livros policiais, eu queria fazer um filme noir para crianças. Um de verdade, com gângsteres, policiais e muito suspense, em um tom realista. Por exemplo, o gato é real, ele não sabe falar. E um dos personagens mais importantes é um ladrão, um gatuno, o que talvez seja surpreendente para o público infantil. Na França, temos muitos livros policiais para crianças, então por que não um filme?

Vocês utilizam várias referências ao cinema policial americano no filme, mas há também referências de animação? O que inspirou você a se tornar um diretor de animação?

Eu gosto muito de animações japonesas e americanas. Por exemplo, o diretor Satoshi Kon fez grandes filmes, como Tokyo Godfathers, Perfect Blue, ou a série de TV Paranoia Agent. Eu também fico impressionado com os filmes da Pixar. Os roteiros são sempre muito inteligentes e os diálogos, como são escritos, são brilhantes.

Alguns diretores da Pixar estão dirigindo filmes live-action, com atores e locações. Você têm essa vontade, de dirigir um filme que não seja animação, algum dia?

Não é um dos meus projetos hoje. O processo de fazer um filme animado é um processo fascinante. Nos dá a possibilidade de criar um mundo com uma caneta e um pedaço de papel. (Eu deveria dizer milhares e milhares de pedaços de papel...) No filme, os personagens estão escalando os telhados da Notre-Dame de Paris. Eu não tenho certeza se isso seria possível na vida real.

Fale um pouco de como é trabalhar no estúdio Folimage.

O que é ótimo na Folimage é trabalhar com uma equipe. Nós estamos tentando fazer filmes da melhor forma possível, em um estúdio pequeno onde todo mundo se conhece. A parte ruim é que temos muita dificuldade em conseguir o dinheiro para fazer nossos filmes. Mas conseguir dinheiro é sempre uma luta no cinema.

E como é fazer um filme policial para crianças?

Crianças são tão boas espectadoras quanto qualquer outra pessoa mais velha. E elas merecem grandes histórias também. Uma boa história é para todo mundo. Os tópicos são diferentes, mas qualquer conto de fadas, com mágicos, bruxas e ogros são tão assustadores quanto qualquer filme de gângster.

Você acha que falta mais ousadia no cinema infantil atual?

Um monte de filmes são feitos apenas com a intenção de fazer muito dinheiro. Cinema é uma indústria e uma arte. Você consegue encontrar fast food e restaurantes três estrelas. É a mesma coisa com as crianças.

Como o processo de realização de uma animação como esta é longo e trabalhoso, vocês já começaram a pensar ou fazer o próximo filme? Podem adiantar alguns detalhes?

Leva tanto tempo para fazer filmes animados, que não podemos esperar muito para começar outro. Agora, estamos trabalhando em um novo projeto. Será outro thriller para crianças, com um lado fantástico. E, dessa vez, se passará em Nova York. Nós deixamos a Torre Eiffel e fomos para a Estátua da Liberdade.

Na foto ao lado: os diretores de Um Gato em Paris, Alain Gagnol (esq.) e Jean-Loup Felicioli (dir.). Crédito: Folimage.

fonte: Cinema em Cena